Presidente da CACO Associação de Artesãos do Concelho de Odemira há um ano, Mariana Dias Coutinho faz ao "SW" um balanço do seu mandato e revela alguns dos projetos que a instituição tem em curso ou pretende lançar.
É presidente da CACO Associação de Artesãos do Concelho de Odemira desde maio de 2023. Que balanço faz deste período?
O balanço é bastante positivo! Este primeiro ano serviu para conhecer mais profundamente a associação e a sua linha de ação, para me ser possível compreender de que modo o meu envolvimento poderia contribuir para o seu desenvolvimento. A CACO é uma associação que já existe desde 2002 e durante estas duas décadas tem vindo a desenvolver-se como estrutura de apoio aos seus artesãos associados, promovendo o seu trabalho e valorizando os materiais endógenos da região do concelho de Odemira. Desde 2019, com a construção do Espaço CRIAR em Odemira, a associação teve a oportunidade de se sustentar como estrutura, passando a ter a capacidade de formar uma equipa contratada e continuar esse trabalho de apoio possibilitando a utilização aos seus associados de oficinas equipadas (cerâmica, têxteis, fibras vegetais, madeiras e metais/ourivesaria) e também expandir a promoção do artesanato regional através da loja e dos seus canais de comunicação. O Espaço CRIAR dá ainda a possibilidade de acolher um programa alargado de workshops, oficinas de criação, exposições e palestras.
Quais têm sido as prioridades na vossa atuação ao longo deste período?
A nossa grande prioridade é a valorização do artesanato regional. Dedicamo-nos a esta missão através da nossa loja, onde divulgamos e vendemos os produtos dos nossos associados, do desenvolvimento de atividades e ações de formação no Espaço CRIAR, da participação em feiras locais como a FEITUR, a FACECO e o Odemira Creative Market, entre outras. Somos também responsáveis pela curadoria e organização de exposições de produtos nos postos de turismo. Fazemos para diferentes agrupamentos de escolas do concelho as AEC [Atividades Extra Curriculares] do Saber-Fazer, realizadas pelos os nossos artesãos e que têm como objetivo dar a oportunidade às crianças de experimentarem técnicas artesanais e também contactarem com alguns dos materiais endógenos da região. Em relação a projetos desenvolvidos, gostava de mencionar o projeto "Moeda Vegetal", que a CACO realizou através da promoção de cinco oficinas sobre a temática das fibras vegetais durante o ano de 2022. O objetivo deste projeto foi valorizar as fibras vegetais endógenas da região e cruzar com outras disciplinas, como a cerâmica e o design. No final, deu origem a uma coleção de novos produtos e colaborações. Temos ainda o projeto "Mãos de Cá", que propõe um conhecimento do território a partir dos nossos artesãos e das suas práticas. Divide-se em duas atividades: a organização de workshops no Espaço Criar e as "Itinerâncias de Saberes", com passeios e visitas aos locais de trabalho dos artesãos.
Quantos associados conta a CACO de momento?
Cerca de 68 associados.
É um número que tem vindo a crescer?
Felizmente vai aumentando todos os anos!
Quais as maiores dificuldades sentidas pelos artesãos de Odemira?
Infelizmente, a maior dificuldade prende-se ainda com a falta de valorização do trabalho artesanal. Apesar de sentirmos que existe um novo interesse nesta área, as pessoas continuam sem entender tudo o que está envolvido na produção de uma peça, o tempo, o cuidado, a relação com a paisagem, o trabalho na maioria das vezes fisicamente árduo... No final do dia, ao comprarem, preferem sempre o mais barato e não necessariamente o que é melhor e também o que (nos) faz melhor. Precisamos de um consumo consciente, que contribua positivamente quer para a nossa região, quer para o nosso planeta. Outra dificuldade muitas vezes sentidas com alguns dos nossos artesãos de "idade maior" prende-se mais com questões de deslocação e distribuição do seu trabalho. Nestes casos, tentamos ir ao seu encontro e facilitamos a recolha e entregas das suas peças, levando-as para a loja da CACO, em Odemira, para os vários postos de turismo do concelho, feiras e exposições.
Sente que esta área, além da preservação das técnicas artesanais da região, tem igualmente potencial económico?
O artesanato como expressão cultural e identitária de uma região possui um interesse e valor enormes, nomeadamente turístico. A partir dele os visitantes podem conhecer uma região, as suas paisagens, os materiais que as compõem, as pessoas e a sua poética, também a tradição, a história e os costumes através dos seus objetos produzidos.
Que projetos tem a CACO atualmente "em mãos"?
Vamos ter um ano de 2024 muito ativo! Temos uma série de projetos desenvolvidos quer em colaboração com os nossos associados quer com entidades parceiras locais. Posso dar alguns exemplos
Claro que sim.
Teremos no inicio de junho o projeto "Roda em Roda", que convoca sete ceramistas locais para uma performance pública a acontecer no Cerro do Peguinho, em Odemira, que pretende criar comunidade entre pares, lançar uma atenção sobre a prática da olaria que no passado era tão presente no concelho e incitar metodologias de colaboração. Será um espetáculo que dará a oportunidade ao público de aceder à criação artística e até poder experimentar. Em setembro, na Biblioteca Municipal, faremos uma exposição com as esculturas e fotografias que documentam o processo. Teremos também o projeto "Recursos à Mão", que pretende promover o conhecimento sobre as fibras vegetais e a lã endógenas do concelho de Odemira. Alguns objetivos deste projeto serão a criação de uma biblioteca técnica, ações de formação com as escolas e também com o público, orientados por artesãos locais, para aprender a recolher, transformar e trabalhar as fibras vegetais e a lã. O projeto também inclui residências artísticas e de investigação. Depois temos vindo a estabelecer uma série de parcerias com entidades locais com as quais temos desenvolvido projetos.
Por exemplo?
Com a associação Project Earth iniciámos agora em maio o projeto de residências artísticas "Guardiões do Mira", que agrega quatro organizações locais geograficamente distribuídas pelo rio Mira: a Project Earth em Santa Clara-a-Velha, a CACO em Odemira, a Cultivamos Cultura em São Luís e a Oficina na Escola em Milfontes. Cada uma acolherá dois artistas em dois períodos diferentes para trabalharem diferentes temáticas tendo o rio Mira como objeto de estudo. Com a a APCO [Associação de Paralisia Cerebral de Odemira], pelo segunda vez, temos já em curso o projeto "Sublimar", que desenvolve com um grupo de utentes atividades de criação nas áreas da cerâmica e da pintura. Temos ainda uma parceria com o Teatro da Targala, em residência permanente no Espaço CRIAR, utilizando o escritório e as áreas das oficinas e das salas de exposições com espaço de ensaio e criação. Com a associação TIC TAC temos a Academia Culinária, dirigida ao público jovem e que utiliza as nossas instalações e a cozinha. E finalmente temos a utilização das nossas instalações para espaço de ensaio de projetos de teatro, dança e performance desenvolvidos por associações ligadas às artes cénicas como a Lavrar o Mar, o Teatro Só e a associação Terra Batida.
Que novas ideias/projetos pretendem lançar no curto/médio prazo?
Vamos continuar a trabalhar na promoção de algumas práticas e materiais da região, como a lã, as fibras vegetais e a cerâmica, que identificámos como materialidades que necessitam de atenção quer para a salvaguarda das técnicas e ofício, quer para se trabalhar cruzamentos transdisciplinares com o design, a arte ou o teatro. Continuará a ser também uma prioridade a transmissão do "saber fazer regional". Queremos criar projetos para atrair o público mais jovem, dando-lhes oportunidades para experimentarem diferentes técnicas através de oficinas com os nossos artesãos. E queremos continuar com projetos inclusivos e que criem a oportunidade para a valorização do nosso artesanato e da nossa região.