15h48 - quinta, 12/01/2023

À vol d'oiseau


António Martins Quaresma
No início do século XX, um autor francês, Léon Poinsard, escrevia o seguinte texto, num livro intitulado Le Portugal Inconnu: "a costa alentejana é geralmente bordejada por alturas ou terraços que descem bruscamente na direcção do mar e formam uma costa pouco hospitaleira, onde os estuários e os abrigos são raros". Concluindo que, depois da embocadura do Sado, "sobre a costa rectilínea e deserta, apenas podemos citar o porto de Sines".
Destinada a um público pouco conhecedor da realidade portuguesa, em geral, e da costa alentejana, em particular, esta informação resulta de um rápido olhar, em boa medida fundamentado, mas superficial, ademais aferindo a observação por uma ordem de grandeza pouco adequada para se dar conta dos pequenos recessos deste trecho de costa, que, no entanto, eram importantes para a população.
Na realidade, não contemplou Porto Covo, pequena, mas ativa, calheta de pescadores e até com alguma navegação de cabotagem. Tão-pouco o porto de Vila Nova de Milfontes, no rio Mira, que servia uma área compreendida grosso modo pelo vasto concelho de Odemira, por onde se fazia um movimento comercial-marítimo com importância suficiente para aqui ter sido criada, alguns anos antes, uma delegação marítima do porto de Setúbal. Ao mesmo nível de Sines, que então tinha igualmente delegação marítima do porto de Setúbal.
Assim se entende que o nosso autor também não tenha feito menção a outros pequenos abrigos pesqueiros existentes nesta costa. Desde logo, o Canal, enseada a cerca de 2 kms a norte da foz do Mira, em cuja extremidade norte existia um carreiro, formando uma "poça" com capacidade para alguns botes, que foi utilizada pelos pescadores de Milfontes, como alternativa ao estuário. Cerca de 1817, os "três ou quatro barcos de pesca" de Milfontes costumavam vir estabelecer-se no Canal, durante o verão, altura do ano em que os pescadores desta vila pescavam no mar. Abrigado dos ventos de norte, que sopravam no verão, e com abundante água doce, constituía uma boa opção para estes pescadores, uma vez que a barra do rio Mira não era segura mesmo no verão. No entanto, findo o período estival, os botes regressavam ao estuário, onde tinham abrigo seguro e podiam pescar no inverno. A certa altura, foi designado por Porto das Barcas, embora o nome mais corrente continuasse a ser Canal.
Na pequena enseada do Sardão, encaixada entre altas arribas de xisto, ao sul do cabo do mesmo nome, o engenheiro Alexandre Massai tinha reparado nas condições propícias para a pesca, numa ocasião em que, por volta do ano de 1600, ali fora enviado para tratar da fazenda de um naufrágio. Sobre o sítio, dizia ser adequado para se "fabricarem" uma ou duas armações, tão boas como as do Algarve, bastando para isso ser limpo de algumas pedras. Tomou depois o nome de Entrada da Barca, embora os mais velhos ainda recordem a designação de Sardão.
Um outro ponto, um pouco mais a norte, perto da actual povoação de Almograve, Lapa de Pombas, era também porto de abrigo de pescadores, assim assinalado no princípio de Oitocentos; nele havia, em 1817, um pequeno movimento de barcos de pesca, nos meses de verão.
Já quanto a Azenha do Mar, nada é de estranhar a sua falta de referência por Poinsard, pois a utilização do lugar por pescadores é mais tardia.
A parte citada do livro de Léon Poinsard ilustra uma situação em que o critério utilizado para descrever uma realidade justifica um olhar pouco pormenorizado dessa realidade. Na verdade, o seu objetivo não era descer ao pormenor, mas apresentar uma imagem genérica. Nós, os leitores, é que temos de entender isso e, se for o caso de querermos melhorar o nosso conhecimento do espaço em questão, havemos de utilizar outras fontes e de cruzar as informações obtidas.



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