10h25 - quinta, 23/02/2023

Para que serve a escola?


Fernando Almeida
Explico por vezes aos meus alunos que a escola pode ser vista como uma superfície comercial onde eles se podem abastecer de grande diversidade de bens para uma viagem que farão no futuro. Devem aproveitar a escola (e a vida) para recolher tudo o que lhes possa vir a fazer falta, como quem enche a mochila antes de uma aventura em percurso desconhecido.
Um dia mais tarde partirão pelo imprevisível caminho que será a sua vida adulta e, então, verão se têm consigo o que necessitam para sobreviver nesse percurso acidentado ou se, pelo contrário, o que colocaram na "mochila" na escola (e na vida) foi insuficiente. Nessa caminhada pelo desconhecido, que é o futuro que os alunos terão pela frente, poderão ter sede, mas se o cantil da água não está com eles haverá um problema; se não levaram a tenda terão que enfrentar a chuva e o frio sem proteção; se o canivete suíço não os acompanha não poderão resolver muitos problemas que surjam no percurso e assim por diante… Provavelmente olharão para trás, lembrarão a escola onde tudo estava disponível ao alcance de um simples esticar de braço e lamentarão não ter abastecido a sua" mochila" com aquilo que lá podiam ter colocado tão facilmente.
Alguns alunos recolhem da escola o mais que lhes é possível e enchem a "mochila" do conhecimento com o que lhes fará falta no futuro. Se precisarem de ler e compreender legislação, textos técnicos, ou de opinião, serão capazes de o fazer sem dificuldade e do mesmo modo poderão responder por escrito ou oralmente sem problemas seja a quem for, sempre que necessário; se precisarem de trabalhar no estrangeiro ou em empresas estrangeiras em Portugal não têm problema, porque serão fluentes em várias línguas; saberão usar programas informáticos conhecidos e estarão preparados para explorar e aprender a usar outros, mesmo que nunca os tenham visto antes; saberão desenhar, produzir e interpretar informação gráfica e cartográfica, saberão matemática, física, química, biologia, história, geografia, terão gosto pela atividade física e consciência dos benefícios que representa para a sua saúde e terão consigo mais um infindável conjunto de conhecimentos e competências que, afinal, estão à disposição na escola para quem os queira recolher. Mas outros não saberão aproveitar tudo o que a escola lhes oferece e partirão para a viagem que é a vida mal preparados…
Alguns jovens (e possivelmente os respetivos pais) julgam que na escola o que mais importa são as classificações, os testes e as suas "notas" e que a escola vale por ser um local onde se obtêm diplomas. Por isso, não transportam consigo o gosto pelo saber, tentando antes ludibriar o sistema sempre que possível de forma a conseguir as tais classificações convenientes, sem necessidade de ganhar as competências que a escola pode fornecer. Estudam hoje para os testes, apenas para esquecer amanhã. Em vez de acumular conhecimentos na "mochila", deitam-nos em saco roto, servindo-se deles apenas para fazer provas e esquecer em seguida. Evidentemente que a cada ciclo de estudos que terminam somam-se as insuficiências e faltam as competências para os ciclos seguintes e mais ainda para a vida futura.
O Estado, por outro lado, sabendo que num país de baixos salários ambos os elementos da maioria dos casais têm que trabalhar para que o rendimento permita a sobrevivência das famílias, atribui à escola a função de manter as crianças ocupadas ao abrigo de perigos e das "más companhias", enquanto os pais estão fora a trabalhar. Para além de "depósito de crianças" de uma sociedade em que os pais não têm tempo para os filhos, o Estado exige à escola a função de obter os resultados estatísticos que se possam exibir nos organismos internacionais e, por isso, se insiste na obtenção de valores de "sucesso" que considera desejáveis. No entanto, em vez de fornecer melhores condições de aprendizagem, como boas instalações e equipamentos, bons materiais, Internet rápida, turmas de dimensão aceitável, desburocratizar a vida das escolas e criação de condições para que a profissão docente atraia os melhores e motive os profissionais já existentes, faz exatamente o contrário a todos os níveis: escolas desadaptadas das necessidades atuais, Internet lenta, turmas grandes demais, professores desmotivados porque desconsiderados e sem perspetiva de carreira justa, ausência quase total de novos candidatos à docência… Para o Estado, a escola parece ser vista como uma atividade geradora de uma despesa que é necessário reduzir ao mínimo e não como um investimento altamente compensador garante do futuro do país.
O mesmo Estado que trata mal a escola e os que nela trabalham, mantém o seu comportamento de investir insuficientemente na educação alegando falta de recursos. No entanto, permite fugas ao fisco e atribui benefícios fiscais às grandes empresas em valores escandalosos que chegam aos milhares de milhões de euros por ano e cada vez se vê melhor que o que falta em Portugal não são os recursos, mas antes visão estratégica, honestidade e bom senso na sua utilização: governantes de vistas curtas, país com futuro comprometido…
Mas com a escola melhor ou pior, os pais e educadores dos nossos jovens não se devem esquecer que o mundo que está para vir é totalmente imprevisível, podendo trazer prosperidade e paz, mas podendo também trazer crises sucessivas e episódios de grandes convulsões. Não se esqueçam também que só há uma coisa que ninguém consegue tirar aos vossos filhos, por mais que o caos se instale na sociedade e a vida os possa despojar de tudo: é o que eles sabem e são capazes de fazer.
Por isso, quando os vossos filhos regressarem da escola, não lhes perguntem pelas "notas", mas antes pelo que aprenderam nesse dia. E já agora, sempre que consigam, dediquem mais algum tempo a ensinar os vossos filhos, porque a responsabilidade de educar os jovens é dos pais e a escola não pode ensinar tudo. Levem-nos a conhecer o mundo, a ouvir as histórias dos velhos e tirem-lhes da frente os jogos viciantes que os têm alienado e mantido fora da vida real ultimamente. Mas, sobretudo, ensinem-nos a procurar e a cultivar o conhecimento, aproveitando tudo o que a escola lhes oferece todos os dias, porque ele será certamente um bem essencial para o seu futuro.



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