10h11 - quinta, 26/10/2023

100º Aniversário da viagem aérea Portugal – Macau. A partida de Milfontes


António Martins Quaresma
Alguma discussão que, em certa altura, se verificou sobre a designação da viagem está ultrapassada. Lisboa-Macau, como os jornais da época muitas vezes a chamaram, ou até Amadora-Macau, como queria o bairrismo amadorense, não fazem hoje qualquer sentido. A viagem iniciou-se em Vila Nova de Milfontes, como decidiram os próprios aviadores, e se, de vez em quando, ainda ouvimos o velho dislate, o problema é de quem o profere.
Partir de Milfontes foi naturalmente uma decisão que se deveu a Brito Pais, cuja família possuía casa nesta vila e que conhecia a planície designada por Coitos, a noroeste da povoação, apropriada para o arranque do Breguet 16BN2, pesado com depósitos suplementares de gasolina. Depois o clima de descrença e até de oposição governamental que havia rodeado a preparação da viagem levara os aviadores a buscar uma abalada mais íntima, como que "em família". Foi, contudo, Sarmento de Beires que, com irritação, se insurgiu, já próximo do fim da vida, em 1974, contra o facto de haver quem quisesse "roubar a Vila Nova de Milfontes a glória, a honra, o privilégio que lhe cabe de figurar na história como local donde, no dia 7 de Abril de 1924, o 'Pátria' partiu para terras portuguesas na orla da China" (Revista do Ar, Abril de 1974).
Efetivamente, o avião esteve em Milfontes, entre a tarde do dia 2 e a manhã do dia 7 de abril, ficando os aviadores alojados em casa da família Brito Pais. No dia 2, Beires ainda voltou a Lisboa, de onde regressou no dia seguinte, acompanhado pelos capitães Jardim da Costa e Pinheiro Correia, delegados do Aero Clube de Portugal para assistirem à partida do "Pátria". Curiosamente, Jardim da Costa seria o futuro marido de Maria do Céu Brito Pais, irmã de António Brito Pais, e Pinheiro Correia o fotógrafo a quem se devem muitas das fotografias tiradas na altura. Aliás, as experiências procurando observar a capacidade de carga do avião também tinham sido feitas em Milfontes, no mês de janeiro.
No dia 4 de abril realizou-se a cerimónia do batismo do avião, "religiosamente primeiro, dionisicamente depois", no dizer de Beires. Ao bispo de Beja, D. José do Patrocínio Dias, antigo camarada de Pais nos campos da Flandres, coube a bênção religiosa do aparelho, enquanto a jovem Maria do Céu Brito Pais, como madrinha, partiu uma garrafa de champanhe no cubo da hélice, gritando o nome "Pátria!". Entretanto, os tripulantes procederam aos plenos de combustível e à última revisão do motor.
O tempo, inicialmente promissor, passara a um sudoeste borrascoso, açoitando o aparelho, desprotegido na planície vizinha do mar. O quadro meteorológico tornara-se adverso, mas a 6 de abril o temporal amainou. E na madrugada nevoenta e fresca de 7 de abril, finalmente, o "Pátria" elevou-se nos ares com destino à sua primeira etapa, levando a bordo António Brito Pais, como navegador, e Sarmento de Beires, como piloto (Manuel Gouveia esperava-os na Tunísia). Em baixo ficavam familiares de Brito Pais, Cifka Duarte e muito povo, gente simples e anónima de Milfontes que quisera associar-se ao momento. O povo, conforme Beires afirmou repetidamente, a quem se deveu, em última análise a viagem.
Resta acrescentar que o avião que partiu de Vila Nova de Milfontes foi adquirido por subscrição pública – tal como o segundo aparelho, quando o "Pátria" ficou irremediavelmente avariado no deserto do Sind, no Norte da Índia. Esse episódio fará parte da próxima crónica.



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