16h34 - quinta, 22/02/2024

Sines, a expansão da cidade depois do porto (1)


Silvano Silva
O artigo aborda as mudanças no território de Sines devido à implementação do complexo industrial e do porto de águas
profundas. As características naturais da Costa de Sines, aliadas à sua posição estratégica, proporcionaram as condições
ideais para o desenvolvimento de um porto de águas profundas. Este porto trouxe à cidade de Sines um maior conforto económico. No entanto, a própria cidade acaba por ser prejudicada pelas condições naturais que possibilitaram a construção do porto; os diversos trabalhos realizados no território acabaram por estrangular o aglomerado urbano em detrimento de vários equipamentos portuários e industriais. O objetivo do trabalho é traçar uma linha transversal da cidade de Sines ao longo da construção do porto.

Introdução
A história de Portugal está intimamente ligada ao mar. Foi através do mar que os portugueses escreveram capítulos importantes, estabelecendo-se como um país de marinheiros. No século XV, deram os primeiros passos em direção à globalização que conhecemos hoje.
A vocação de Portugal pelo mar está intimamente ligada à nossa localização estratégica e ao facto de sermos um país de marinheiros. Sines é, por excelência, um lugar com vocação portuária e industrial, não só pela sua localização estratégica, como pela profundeza das suas águas. (Carvalho, 2005, p.19)
A pesquisa tem como objetivo principal destacar as mudanças no território de Sines, abrangendo a evolução da sua estrutura urbana e as alterações relacionadas diretamente com a construção do porto e do complexo industrial. A análise e consulta do relatório do Gabinete da Área de Sines (GAS) oferecem uma visão abrangente da evolução do porto até à extinção do GAS. Além disso, ao ter acesso às primeiras plantas originais das diferentes expansões industriais ao longo da costa, juntamente com imagens aéreas focadas numa faixa temporal específica, entre a década de 1960 e 2018, é possível obter uma compreensão mais clara de como a cidade de Sines se desenvolveu e como a indústria, estabelecida na região, pode ter influenciado o seu crescimento urbano.

Complexo Industrial | Porto
| Enquadramento Histórico

Com o objetivo de selecionar o local para a implantação de um novo porto em Portugal, entre os finais de 1960 e inícios de 1970, foi desenvolvido um estudo que considerou as opções de Alcochete, Setúbal e Sines. O estudo foi orientado por dois pontos cruciais: a necessidade de criar núcleos habitacionais para sustentar os recursos humanos e a importância de um porto de águas profundas capaz de receber navios de grande porte.
Devido às suas condições naturais como profundidade das águas e características territoriais, a região de Sines foi escolhida para sediar o complexo industrial em detrimento das outras opções, Alcochete e Setúbal. Após a seleção do local de implantação, foi criado o Gabinete da Área de Sines, que recebeu personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira.
O GAS ? Gabinete da Área de Sines foi criado nos Anos 70, durante o governo de Marcelo Caetano, por meio do Decreto-lei nº 270/71. A missão era promover o desenvolvimento urbano e industrial da zona de Sines, incluindo a criação de uma área concentrada de indústrias de base e serviços de apoio, bem como um terminal oceânico. Esta área também incorporaria diversas infraestruturas de interligação entre as unidades industriais (Carvalho, 2005, p. 100).
Em 1972, a área de Sines era caracterizada por uma baixa densidade demográfica, com cerca de quarenta habitantes por quilómetro quadrado, e um povoamento disperso. A atividade predominante era agrícola, com predominância de sistemas familiares, com exceção de Sines e Porto Covo, onde o setor pesqueiro tinha alguma relevância. A atividade industrial era limitada, com apenas duas unidades em 1970, enquanto o turismo estava numa fase de desenvolvimento, com alguma presença na Costa de Santo André, Sines e Porto Covo. O início do processo de desenvolvimento da área foi baseado no Plano Geral, que integrava três setores principais: o porto de águas profundas, o complexo industrial e a "nova" cidade. Isso modificou profundamente as características socioeconómicas de uma vasta área de cerca de 40.000 hectares, definida como a área de intervenção pelo Gabinete.
De acordo com o Plano Geral, a disponibilidade de terrenos era de cerca de 19.000 hectares, considerando que os restantes 21.000 hectares eram áreas florestais, áreas de valor agrícola e áreas com pendente superior a dez por cento. Cabia ao Gabinete programar a ocupação do território. As expropriações de terras apresentaram-se como uma das maiores problemáticas, juntamente com o reordenamento e realojamento da população rural, que deveriam ser integrados de acordo com a função urbana definida para a Área.
Em 1971, previa-se que as exigências da concentração urbano-industrial levassem à reserva de terrenos para diferentes finalidades, como habitação, equipamentos urbanos, implantação de atividades industriais, instalações portuárias, ferrovias, grandes acessos e outros elementos do mesmo tipo. A localização também permitiria a possibilidade de uma vasta expropriação de terrenos (GAS 1973, p. 200). A Planta Fig. 1, de reconhecimento territorial, compreende aproximadamente os limites originais da zona de influência do extinto GAS.

Planeamento Industrial
Em 1972, foram apresentadas duas propostas para a organização do complexo industrial. Partia-se do princípio que as características do porto de Sines deveriam ser ditadas pelo planeamento da zona industrial. Nesse contexto, as hipóteses para o complexo industrial subdividiam-se em duas: na hipótese A (Fig. 3, baía de Sines) e na hipótese B (Fig. 4, São Torpes).
Segundo o relatório do GAS, a diferença entre as duas seria:
- Em função do grau de acessibilidade exigido para o porto, caminho de ferro e rodovias. Um dos principais elementos diferenciadores em cada uma das hipóteses era que, na hipótese B, oferecia algumas vantagens devido à menor extensão do percurso dos navios para os tanques. Por outro lado, a hipótese A apresentava a vantagem da redução dos custos iniciais em infraestruturas de transporte rodoviário e ferroviário, possibilitando uma maior utilização da rede viária de ligação entre as áreas industriais e as novas áreas urbanas.
- Em função das relações de interdependência das indústrias: ambos os esquemas são muito equivalentes nesse aspeto, embora a localização do porto em São Torpes permitisse uma maior agregação das indústrias.
- Em função do grau de acessibilidade exigido em relação aos núcleos urbanos: este foi o fator mais diferenciado entre as hipóteses. Enquanto a hipótese A destacava a vantagem da existência de um aglomerado urbano, Sines, que poderia servir de apoio para a atividade portuária, na hipótese B a maior parte dos serviços de apoio teria que ser criada ou seria necessário recorrer a Sines, o que acarretaria custos adicionais significativos.
- Em função dos condicionamentos físicos, climáticos, geotécnicos e fitológicos: não foram evidenciadas diferenças entre as duas hipóteses.
- Em função dos condicionamentos de infraestruturas: a instalação de infraestruturas de base em qualquer um dos esquemas não apresenta diferenças significativas, podendo-se afirmar que os custos seriam sensivelmente iguais (GAS, 1973, p. 44).
Após equacionar os princípios expostos e analisar os condicionamentos, a equipe responsável pela elaboração do plano geral decidiu adotar a hipótese A, que previa a instalação do porto na baía de Sines e a consequente organização das áreas industriais.



Trulli
Fig. 1. Zona de Influencia Gabinete da Área de Sines (1972).
Arquivo distrital de Setúbal, zona de Influência do Gabinete do Área de Sines




Trulli
Fig. 2. Porto de Construção
Porto de Sines: Porta Atlântica da Europa (2005) Fotografia aérea, construção do porto de construção 1974




Trulli
Fig. 3. Organização áreas Industriais.
Gabinete da Área de Sines (1973). Plano Geral da Área de Sines. Lisboa: Imprensa Nacional da Casa da Moeda




Trulli
Fig. 4. Organização Áreas Industriais Esquema B
Gabinete da Área de Sines (1973). Plano Geral da Área de Sines. Lisboa: Imprensa Nacional da Casa da Moeda





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