17h34 - quinta, 27/07/2023
Do futebol
António Martins Quaresma
O futebol, essa invenção inglesa que revolucionou a prática e o espetáculo desportivos, foi introduzido em Portugal, pela aristocracia, por finais do Século XIX. Rapidamente, porém, a novidade saiu da esfera das elites e popularizou-se, suplantando os jogos e "desportos" tradicionais.
A popularidade e o sucesso do futebol, na maior parte do mundo, já foi objeto de teses antropológicas, a mais conhecida delas da autoria de Desmond Morris. Para este etólogo (inglês, naturalmente), as raízes da nossa "Tribo do Futebol" mergulham fundo no passado primitivo da Humanidade. O futebol será assim uma metáfora contemporânea da atividade dos caçadores pré-históricos, em que a resistência, a agilidade, a rapidez, a inteligência e a cooperação entre os elementos do grupo continua presente, embora na ausência de necessidade de caçar para sobreviver.
Os principais jogos, mormente as finais das principais competições, quer de clubes quer de seleções, são vistos presencialmente por muitos milhares de pessoas e, através da televisão, por milhões. Os modernos meios de transmissão direta de eventos, seja em que parte do mundo for, permitem a multiplicação exponencial da assistência do espetáculo desportivo. E os seus principais artistas convertem-se em ídolos renomados. Se, em boa parte, Portugal é hoje reconhecido, à escala mundial, é por causa do futebol profissional, especialmente devido às suas estrelas. Antes o Eusébio, agora o Cristiano Ronaldo.
No concelho de Odemira, a prática organizada e oficializada, já tem mais de um século, através de dois clubes. Em 2020, Sporting Clube Santaclarense, fundado em 1920, enquanto filial do Sporting Clube de Portugal, completou um século de existência e, no corrente ano de 2023, o Sport Clube Odemirense comemorou também o seu centésimo aniversário. O concelho mantém, actualmente, três equipas na 1ª divisão da Associação de Futebol de Beja: na época passada, estiveram o Grupo Desportivo Renascente, de São Teotónio, o Praia de Milfontes e o Odemirense. E na 2ª divisão competiram o Santaclarense, o Boavista, o Naverredondense e o Pereirense.
Revendo algumas crónicas que publiquei num jornal regional, já lá vão mais de 20 anos, sobre os primeiros tempos do futebol, encontrei, entre outros, um texto sobre a "bola" em Milfontes, nos anos de 1950-70, antes da fundação do clube designado por "Praia de Milfontes" (em 1977). Nele, mencionei os nomes de muitos dos protagonistas, os equipamentos, as mudanças do campo e as dificuldades vencidas para transformar um areal solto num campo de futebol com meios assaz primitivos. Deparei-me ainda com algumas fotografias, algumas desses tempos, cedidas por amigos, entre os quais o Armando Silva, que foi um hábil jogador. Ele, o Tito e mais alguns jogaram, depois, no Odemirense, quando a vila de Odemira tinha uma boa equipa e Milfontes a provia de alguns atletas.
São duas dessas fotografias que recupero para esta crónica. A primeira [em cima] mostra uma equipa formada por atletas que ostentam longos cabelos, à moda dos anos de 1970, num campo que ainda tinha um pinhal como fundo. São reconhecíveis, e a maioria vive em Milfontes, mas, claro, já não correm como corriam, nem saltam como saltavam. Alguns já não estão, sequer, entre nós. A segnda foto é mais recente e mostra uma nova geração de jogadores. Dois deles são filhos de praticantes que estão na primeira foto, mostrando alguma continuidade familiar da prática do futebol.
Para concluir, é de realçar, mais uma vez, o papel dos clubes de futebol, enquanto fomentadores do desporto no concelho, seguindo, aliás, o que se passa um pouco por todo o lado. Além do futebol, as vilas de Odemira e Milfontes têm ainda uma notável presença na canoagem, que aproveita as boas condições do rio Mira, e que, no fundo, se pode inserir na tradição das antigas atividades recreativas e desportivas informais ligadas ao rio e ao mar. A ela espero dedicar uma das próximas crónicas.
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